MATÉRIA 02 - TEOLOGIA: DOUTRINA DE DEUS
I. DEFINIÇÕES DE DEUS:
A) Definição Filosófica de
Platão: Deus é o começo, o meio e o fim de todas as coisas. Ele é a mente ou
razão suprema; a causa eficiente de todas as coisas; eterno, imutável,
onisciente, onipotente; tudo permeia e tudo controla; é justo, santo, sábio e
bom; o absolutamente perfeito, o começo de toda a verdade, a fonte de toda a
lei e justiça, a origem de toda a ordem e beleza e, especialmente, a causa de
todo o bem.
B) Definição Cristã do Breve
Catecismo: Deus é um Espírito, infinito, eterno e imutável em Seu Ser,
sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade.
C) Definição Combinada: Deus é um
espírito infinito e perfeito em quem todas as coisas tem sua origem,
sustentação e fim (Jo.4:24; Ne.9:6; Ap.l:8; Is.48:12; Ap.1:17).
D) Definições Bíblicas: As
expressões "Deus é Espírito" (Jo.4:24) e "Deus é Luz "
(IJo.1:5), são expressões da natureza essencial de Deus, enquanto que a
expressão "Deus é amor" (IJo.4:7) é expressão de Sua personalidade.
(ITm.6:16)
II. ESSÊNCIA OU NATUREZA DE
DEUS:
Quando falamos em essência de
Deus, queremos significar tudo o que é essencial ao Seu Ser como Deus, isto é,
substância e atributos.
A) Substância de Deus:
1) Há duas substâncias: matéria e
espírito.
2) Deus é uma substância simples:
A substância de Deus é puro espírito, sem mistura com a matéria (Jo.4:24).
B) Atributos de Deus:
Sua substância é Espírito e Seus
atributos são as qualidades ou propriedades dessa substância. Atributos é a
manifestação do Ser de Deus.
III. CLASSIFICAÇÃO DOS ATRIBUTOS:
A) Naturais e Morais: Também
chamados de "intransitivos e transitivos", "incomunicáveis e
comunicáveis", "absolutos e relativos", "negativos e
positivos" ou "imanentes e emanentes".
B) Atributos Naturais:
1) Vida: Deus tem vida; Ele ouve,
vê, sente e age, portanto é um Ser vivo (Jo.10:10; Sl.94:9,l0; IICr.16:9;
At.14:15; ITs.1:9). Quando a Bíblia fala do olho, do ouvido, da mão de Deus,
etc., fala metaforicamente. A isto se dá o nome de antropomorfismo. Deus é vida
(Jo.5:26; 14:26) e o princípio de vida (At.17:25,28).
2) Espiritualidade: Deus, sendo
Espírito, é incorpóreo, invisível, sem substância material, sem partes ou
paixões físicas e, portanto, é livre de todas as limitações temporais (Jo.4:24;
Dt.4:15-19,23; Hb.12:9; Is.40:25; Lc.24:39; Cl.1:15; ITm.1:17; IICo.3:17)
3) Personalidade: Existência
dotada de auto-consciência e auto-determinação (Ex.3:14; Is.46:11).
a) Volição ou vontade = querer
(Is.46:10; Ap.4:11).
b) Razão ou intelecto = pensar
(Is.14:24; Sl.92:5; Is.55:8).
c) Emoção ou sensibilidade =
sentir (Gn.6:6, IRs.11:9, Dt.6:15; Pv.6:16; Tg.4:5)
4) Tri-Unidade:
a) Unidade de Ser: Há no Ser
divino apenas uma essência indivisível. Deus é um em sua natureza constitucional.
A palavra hebraica que significa um no sentido absoluto é yacheed(Gn.22:2),
isto é, uma unidade numérica simples. Essa palavra não é empregada para
expressar a unidade da divindade. A unidade da divindade é ensinada nas
palavras de Jesus: Eu e o Pai somos um. (Jo.10:30). Jesus está falando da
unidade da essência e não de unidade de propósito. (Jo.17:11,21-23,
IJo.5:7)
b) Trindade de Personalidade: Há
três Pessoas no Ser divino: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A palavra
hebraica que significa um no sentido de único é echad que se refere a uma
unidade composta. Esta palavra é empregada para expressar a unidade da
divindade. Esta palavra é usada em Dt.6:4; Gn.2:24 e Zc.14:9 (Veja também
Dt.4:35;32:39; ICr.29:1; Is.43:10;44:6;45:5; IRs.8:60; Mc.10:9;12:29;
ICo.8:5,6; ITm.2:5; Tg.2:19; Jo.17:3; Gl.3:20; Ef.4:6).
c) Elohim: Este nome está no
plural e não concorda com o verbo no singular quando designativo de Deus
(Gn.1:26;3:22; 11:6,7;20:13;48:15; Is.6:8)
d) Há distinção de Pessoas na
Divindade: Algumas passagens mostram uma das Pessoas divinas se referindo à
outra (Gn.19:24; Os.1:7; Zc.3:1,2; IITm.1:18; Sl.110:1; Hb.1:9).
5) Auto-Existência: Jerônimo
disse: Deus é a origem de Si mesmo e a causa de Sua própria substância.
Jerônimo estava errado, pois Deus não tem causa de existência, pois não criou a
Si mesmo e não foi causado por outra coisa ou por Si mesmo; Ele nunca teve
início. Ele é o Eterno EU SOU (Ex.3:14), portanto Deus é absolutamente
independente de tudo fora de Si mesmo para a continuidade e perpetuidade de Seu
Ser. Deus é a razão de sua própria existência (Jo.5:26; At.17:24-28;
ITm.6:15,16).
6) Infinidade ou Perfeição É o
atributo pelo qual Deus é isento de toda e qualquer limitação em seu Ser e em
seus atributos (Jó.11:7-10; Mt.5:48). A infinidade de Deus se contrasta com o
mundo finito em sua relação tempo-espaço.
a) Eternidade: A infinidade de
Deus em relação ao tempo é denominada eternidade. Deus é Eterno (Sl.90:2;
102:12,24-27; Sl.93:2; Ap.1:8; Dt.33:27; Hb.1:12). A eternidade de Deus não
significa apenas duração prolongada, para frente e para traz, mas sim que Deus
transcende a todas as limitações temporais (IIPe.3:8) existentes em sucessões
de tempo. Deus preenche o tempo. Nossa vida se divide em passado, presente e futuro.
mas não há essa divisão na vida de Deus. Ele é o Eterno EU SOU. Deus é elevado
acima de todos os limites temporais e de toda a sucessão de momentos, e tem a
totalidade de sua existência num único presente indivisível (Is.57:15).
b) Imensidão: A infinidade de
Deus em relação ao espaço é denominada imensidão ou imensidade. Deus é imenso
(Grande ou Majestoso; Jó.36:5,26; Jó.37:22,23; Jr.22:18; Sl.145:3). Imensidão é
a perfeição de Deus pela qual Ele transcende (ultrapassa) todas as limitações
espaciais e, contudo está presente em todos os pontos do espaço com todo o seu
Ser PESSOAL (não é panteísmo). A imensidão de Deus é intensiva e não extensiva,
isto é, não significa extensão ilimitada no espaço, como no panteísmo. A
imensidão de Deus é transcendente no espaço (intramundano ou imanente = dentro
do mundo - Sl.139:7-12; Jr.23:23,24) e fora do espaço (supramundano = acima do
mundo; extramundano = além do mundo; emanente = fora do mundo - IRs.8:27;
Is.57:15).
c) Onipresença: É quase sinônimo
de imensidão: A imensidade denota a transcendência no espaço enquanto que a
onipresença denota a imanência no espaço. Deus é imanente em todas as Suas
criaturas e em toda a criação. A imanência não deve ser confundida com o
panteísmo (tudo é Deus) ou com o deísmo que ensina que Deus está presente no
mundo apenas com seu poder (per portentiam) e não com a essência e natureza de
ser Ser (per essentiam et naturam) e que age sobre o mundo à distância. Deus
ocupa o espaço repletivamente porque preenche todo o espaço e não está ausente
em nenhuma parte dele, mas tampouco está mais presente numa parte que noutra
(Sl.139:11,12). Deus ocupa o espaço variavelmente porque Ele não habita na
terra do mesmo modo que habita no céu, nem nos animais como habita nos homens,
nem nos ímpios como habita nos piedosos, nem na igreja como habita em Cristo
(Is.66:1; At.17:27,28; Compare Ef.1:23 com Cl.2:9).
7) Imutabilidade É o atributo
pelo qual não encontramos nenhuma mudança em Deus, em sua natureza, em seus
atributos e em seu conselho.
a) A "base" para a
imutabilidade de Deus: É Sua simplicidade, eternidade, auto-existência e
perfeição. Simplicidade porque sendo Deus uma substância simples, indivisível,
sem mistura, não está sujeito a variação (Tg.1:17). Eternidade porque Deus não está
sujeito às variações e circunstâncias do tempo, por isso Ele não muda
(Sl.102:26,27; Hb.1:12 e 13:8). Auto-existência porque uma vez que Deus não é
causado, mas existe em Si mesmo, então Ele tem que existir da forma como
existe, portanto sempre o mesmo (Ex.3:14). E perfeição porque toda mudança tem
que ser para melhor ou pior e sendo Deus absolutamente perfeito jamais poderá
ser mais sábio, mais santo, mais justo, mais misericordioso, e nem menos. Por
isso Deus é imutável como a rocha (Dt.32:4).
b) Imutabilidade não significa
imobilidade: Nosso Deus é um Deus de ação (Is.43:13).
c) Imutabilidade implica em não
arrependimento: Alguns versículos falam de Deus como se Ele se arrependesse
(Ex.32:14, IISm.24:16, Jr.18:8; Jl.2:13). Trata-se de antropomorfismo
(Nm.23:19; Rm.11:29; ISm.15:29; Sl.110:4).
d) Imutabilidade de Deus em Sua
natureza: Deus é perfeito em sua natureza por isso não muda nem para melhor nem
para pior (Ml.3:6).
e) Imutabilidade de Deus em Seus
atributos: Deus é imutável em suas promessas (IRs.8:56; IICo.1:20); em sua
misericórdia (Sl.103:17; Is.54:10); em sua justiça (Ez.8:18); em seu amor
(Gn.18:25,26).
f) Imutabilidade de Deus em Seu
conselho: Deus planejou os fatos conforme a sua vontade e decretou que este
plano seja concretizado. Nada poderá se opor à sua vontade. O próprio Deus
jamais mudará de opinião, mas fará conforme seu plano predeterminado
(Is.46:9,10; Sl.33:11; Hb.6:17).
8) Onisciência Atributo pelo qual
Deus, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e a todas as
coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples. O conhecimento de Deus
tem suas características:
a) É arquétipo: Deus conhece o
universo como ele existe em Sua própria idéia anterior à sua existência como
realidade finita no tempo e no espaço; e este conhecimento não é obtido de
fora, como o nosso (Rm.11:33,34).
b) É inato e imediato: Não
resulta de observação ou de processo de raciocínio (Jó.37:16)
c) É simultâneo: Não é sucessivo,
pois Deus conhece as coisas de uma vez em sua totalidade, e não de forma
fragmentada uma após outra (Is.40:28).
d) É completo: Deus não conhece
apenas parcialmente, mas plenamente consciente (Sl.147:5).
e) Conhecimento necessário:
Conhecimento que Deus tem de Si mesmo e de todas as coisas possíveis, um
conhecimento que repousa na consciência de sua onipotência. É chamado
necessário porque não é determinado por uma ação da vontade divina. (Por
exemplo: O conhecimento do mal é um conhecimento necessário porque não é da
vontade de Deus que o mal lhe seja conhecido (Hc.1:13) Deus não pode nem quer
ver o mal, mas o conhece, não por experiência, que envolve uma ação de Sua
vontade, mas sim por simples inteligência, por ser ato do intelecto divino
(veja IICo.5:21 onde o termo grego ginosko é usado).
f) Conhecimento livre: É aquele
que Deus tem de todas as coisas reais, isto é, das coisas que existiram no
passado, que existem no presente e existirão no futuro. É também chamado
visionis, isto é, conhecimento de vista.
g) Presciência: Significa conhecimento
prévio; conhecimento de antemão. Como Deus pode conhecer previamente as ações
livres dos homens? Deus decretou todas as coisas, e as decretou com suas causas
e condições na exata ordem em que ocorrem, portanto sua presciência de coisas
contingentes (ISm.23:12; IIRs.13:19; Jr.38:17-20; Ez.3:6 e Mt.11:21) apoia-se
em seu decreto. Deus não originou o mal mas o conheceu nas ações livres do
homem (conhecimento necessário), o decretou e preconheceu os homens. Portanto a
ordem é: conhecimento necessário, decreto, presciência. A presciência de Deus é
muito mais do que saber o que vai acontecer no futuro, e seu uso no N.T. é
empregado como na LXX que inclui Sua escolha efetiva (Nm.16:5; Jz.9:6; Am.3:2).
Veja Rm.8:29; IPe.1:2; Gl.4:9. Como se processou o conhecimento necessário de
Deus nas livres ações dos homens antes mesmo que Ele as decretasse? A liberdade
humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, solta no ar, que pende numa
ou noutra direção, mas é determinada por nossas próprias considerações intelectuais
e caráter (lubentia rationalis = auto-determinação racional). Liberdade não é
arbitrariedade e em toda ação racional há um porquê, uma razão que decide a
ação. Portanto o homem verdadeiramente livre não é o homem incerto e
imprevisível, mas o homem seguro. A liberdade tem suas leis - leis espirituais
- e a Mente Onisciente sabe quais são (Jo.2:24,25). Em resumo, a presciência é
um conhecimento livre (scientia libera) e, logicamente procede do decreto,
"...segundo o decreto sua vontade" (Ef.1:11).
h) Sabedoria: A sabedoria de Deus
é a Sua inteligência como manifestada na adaptação de meios e fins. Deus sempre
busca os melhores fins e os melhores meios possíveis para a consecução dos seus
propósitos. H.B. Smith define a sabedoria de Deus como o Seu atributo através
do qual Ele produz os melhores resultados possíveis com os melhores meios
possíveis. Uma definição ainda melhor há de incluir a glorificação de Deus:
Sabedoria é a perfeição de Deus pela qual Ele aplica o seu conhecimento à
consecução dos seus fins de um modo que o glorifica o máximo (Rm.ll:33-36;
Ef.1:11,12; Cl.1:16). Encontramos a sabedoria de Deus na criação (Sl.19:1-7;
Sl.104), na redenção (ICo.2:7; Ef.3:10) . A sabedoria é personificada na Pessoa
do Senhor Jesus (Pv.8 e ICo.1:30; Jó.9:4; veja também Jó 12:13,16).
9) Onipotência É o atributo pelo
qual encontramos em Deus o poder ilimitado para fazer qualquer coisa que Ele
queira.
A onipotência de Deus não
significa o exercício para fazer aquilo que é incoerente com a natureza das coisas,
como, por exemplo, fazer que um fato do passado não tenha acontecido, ou traçar
entre dois pontos uma linha mais curta do que uma reta. Deus possui todo o
poder que é coerente com Sua perfeição infinita, todo o poder para fazer tudo
aquilo que é digno dEle. O poder de Deus é distinguido de duas maneiras:
- Potentia Dei absoluta =
absoluto poder de Deus e potentia Dei ordinata = poder ordenado de Deus.
- Hodge e Shedd definem o poder
absoluto de Deus como a eficiência divina, exercida sem a intervenção de causas
secundárias, e o poder ordenado como a eficiência de Deus, exercida pela
ordenada operação de causas secundárias.
- Chanock define o poder absoluto
como aquele pelo qual Deus é capaz de fazer o que Ele não fará, mas que tem
possibilidade de ser feito, e o poder ordenado como o poder pelo qual Deus faz
o que decretou fazer, isto é, o que Ele ordenou ou marcou para ser posto em
exercício; os quais não são poderes distintos, mas um e o mesmo poder. O seu
poder ordenado é parte do seu poder absoluto, pois se Ele não tivesse poder
para fazer tudo que pudesse desejar, não teria poder para fazer tudo o que Ele
deseja. Podemos, portanto, definir o poder ordenado de Deus como a perfeição
pela qual Ele, mediante o simples exercício de Sua vontade, pode realizar tudo
quanto está presente em Sua vontade ou conselho. E' óbvio, porém, que Deus pode
realizar coisas que a Sua vontade não desejou realizar (Gn.18:14; Jr.32:27;
Zc.8:6; Mt.3:9; Mt.26:53). Entretanto há muitas coisas que Deus não pode
realizar. Ele não pode mentir, pecar, mudar ou negar-se a Si mesmo (Nm.23:19;
ISm.15:29; IITm.2:13; Hb.6:18; Tg.1:13,17; Hb.1:13; Tt.1:3), isto porque não há
poder absoluto em Deus, divorciado de Sua perfeições, e em virtude do qual Ele
pudesse fazer todo tipo de coisas contraditórias entre Si (Jó.11:7). Deus faz
somente aquilo que quer fazer (Sl.115:3; Sl.135:6).
a) El-Shaddai: A onipotência de
Deus se expressa no nome hebraico El-Shaddai traduzido por Todo-Poderoso
(Gn.17:1; Ex.6:3; Jó.37:23 etc).
b) Em todas as coisas: A
onipotência de Deus abrange todas as coisas (ICr.29:12), o domínio sobre a
natureza (Sl.107:25-29; Na.1:5,6; Sl.33:6-9; Is.40:26; Mt.8:27; Jr.32:17;
Rm.1:20), o domínio sobre a experiência humana (Sl.91:1; Dn.4:19-37; Ex.7:1-5;
Tg.4:12-15; Pv.21:1; Jó.9:12; Mt.19:26; Lc.1:37), o domínio sobre as regiões
celestiais (Dn.4:35; Hb.1:13,14; Jó.1:12; Jó 2:6).
c) Na criação, na providência e
na redenção: Deus manifestou o seu poder na criação (Rm.4:17; Is.44:24), nas
obras da providência (ICr.29:11,12) e na redenção (Rm.1:16; ICo.1:24).
10) Soberania ou Supremacia
Atributo pelo qual Deus possui completa autoridade sobre todas as coisas
criadas, determinando-lhe o fim que desejar (Gn.14:19; Ne.9:6; Ex.18:11;
Dt.10:14,17; ICr.29:11; IICr.20:6; Jr.27:5; At.17:24-26; Jd.4; Sl.22:28;
47:2,3,8; 50:10-12; 95:3-5; 135:5; 145:11-13; Ap.19:6).
a) Vontade ou Auto-determinação:
A perfeição de Deus pela qual Ele, num ato sumamente simples, dirige-se à Si
mesmo como o Sumo Bem (deleita-se em Si mesmo como tal) e às Suas criaturas por
amor do Seu nome (Is.48:9,11,14; Ez.20:9,14,22,44; Ez.36:21-23).
A vontade de Deus recebe variadas
classificações, pois à ela são aplicadas diferentes palavras hebraicas
(chaphets, tsebhu, ratson) e gregas (boule, thelema).
- Vontade Preceptiva: Na qual
Deus estabeleceu preceitos morais para reger a vida de Suas criaturas
racionais. Esta vontade pode ser desobedecida com freqüência (At.13:22;
IJo.2:17; Dt.8:20).
- Vontade Decretória: Pela qual
Deus projeta ou decreta tudo o que virá a acontecer, quer pretenda realizá-lo
causativamente, quer permita que venha a ocorrer por meio da livre ação de suas
criaturas (At.2:23; Is.46:9-11). A vontade decretória é sempre obedecida. A
vontade decretória e a vontade preceptiva relacionam-se ao propósito em
realizar algo.
- Vontade de Eudokia: Na qual
Deus deleita-se com prazer em realizar um fato e com desejo de ver alguma coisa
feita. Esta vontade, embora não se relacione com o propósito de fazer algo, mas
sim com o prazer de fazer algo, contudo corresponde àquilo que será realizado
com certeza, tal como acontece com a vontade decretória (Sl.115:3; Is.44:28;
Is.55:11).
- Vontade de Eurestia: Na qual
Deus deleita-se com prazer ao vê-la cumprida por Suas criaturas. Esta vontade
abrange aquilo que a Deus apraz que Suas criaturas façam, mas que pode ser
desobedecido, tal como acontece com a vontade preceptiva (Is.65:12).
- A vontade de eudokia não se
refere somente ao bem, e nela não está sempre presente o elemento de deleite
(Mt.11:26). A vontade de eudokia e a vontade de eurestia relacionam-se ao
prazer em realizar algo.
- Vontade de Beneplacitum: Também
chamada Vontade Secreta. Abrange todo o conselho secreto e oculto de Deus.
Quando esta vontade nos é revelada, ela torna-se na Vontade do Signum ou
Vontade Revelada. A distinção entre a vontade de beneplacitum e a vontade de
signum encontra-se em Deuteronomio.29:29.
- A vontade secreta é mencionada
em Sl.115:3; Dn.4:17,25,32,35; Rm.9:18,19; Rm.11:33,34; Ef.1:5,9,11, enquanto
que a vontade revelada é mencionada em Mt.7:21; Mt.12:50; Jo.4:34; Jo.7:17;
Rm.12:2). Esta vontade está mui perto de nós (Dt.30:14; Rm.10:8). A vontade
secreta de Deus pertence a todas as coisas que Ele quer efetuar ou permitir,
tal como acontece na vontade decretória, sendo portanto, absolutamente fixa e
irrevogável.
b) Liberdade: A perfeição de Deus
no exercício de Sua vontade. Deus age necessária e livremente. Assim como há
conhecimento necessário e conhecimento livre, há também uma voluntas necessária
= vontade necessária e uma voluntas libera = vontade livre. Na vontade
necessária Deus não está sob nenhuma compulsão, mas age de acordo com a lei do
Seu Ser, pois Ele necessariamente quer a Si próprio e quer a Sua natureza
santa. Deus necessariamente se ama a Si próprio e Suas perfeições. As Suas
criaturas são objetos de Sua vontade livre, pois Deus determina voluntariamente
o que e quem Ele criará; e os tempos, lugares e circunstâncias de suas vidas.
Ele traça as veredas de todas as Suas criaturas, determina o seu destino e as
utiliza para Seus propósitos (Jó.ll:10; Jó.23:13,14; Jó.33:13. Pv.16:4; Pv.21:1; Is.10:15;
Is.29:16; Is.45:9; Mt.20:15; Ap.4:11;Rm.9:15-22; ICo.12:11).
C) Atributos Morais:
1) Santidade: É a perfeição de
Deus, em virtude da qual Ele eternamente quer manter e mantém a Sua excelência
moral, aborrece o pecado, e exige pureza moral em suas criaturas. Ser Santo vem
do hebraico qadash que significa cortar ou separar. Neste sentido também o Novo
testamento utiliza as palavras gregas hagiazo e hagios.
A santidade de Deus possui dois
diferentes aspectos, podendo ser positiva ou negativa (Hb.1:9;Am.5:15;
Rm.12:9).
a) Santidade Positiva: Expressa
excelência moral de Deus na qual Ele é absolutamente perfeito, puro e íntegro
em Sua natureza e Seu caráter (IJo.1:5; Is.57:15; IPe.1:15,16; Hc.1:13). A
santidade positiva é amor ao bem.
b) Santidade Negativa: Significa
que Deus é inteiramente separado de tudo quanto é mal e de tudo quanto o
aborrece (Lv.11:43-45; Dt.23:14; Jó.34:10; Pv.15:9,26; Is.59:1,2; Lc.20:26; Hc.
1:13; Pv.6:16-19; Dt.25:16; Sl.5:4-6). A santidade negativa é ódio ao mal.
Além de possuir dois aspectos a
santidade de Deus possui também duas maneiras diferentes de manifestar-se:
c) Retidão: Também chamada
justiça absoluta, é a retidão da natureza divina, em virtude da qual Ele é
infinitamente Reto em Si mesmo (santidade legislativa). Sl.145:17; Jr.12:1;
Jo.17:25; Sl.116:5; Ed.9:15.
d) Justiça: Também chamada
justiça relativa, é a execução da retidão ou a expressão da justiça absoluta
(santidade judicial). Strong a chama de santidade transitiva. A retidão é a
fonte da Santidade de Deus, a justiça é a demonstração de Sua santidade.
A justiça de Deus pode ser
retributiva e remunerativa. A justiça retributiva se divide em punitiva e
corretiva. A justiça punitiva é aquela pela qual Deus pune os pecadores pela
transgressão de Suas leis. Esta justiça de Deus exige a execução das
penalidades impostas por Suas leis (Sl.3:5;11:4-7 Dt.32:4; Dn.9:12,14;
Ex.9:23-27;34:7). A justiça corretiva é aquela pela qual Deus "pune"
Seus filhos para corrigi-los (Hb.12:6,7). Aqueles que não são Seus filhos, Deus
pune como um Juiz Severo (Rm.11:22; Hb.10:31), mas aos Seus filhos, Deus
"pune" (corrige) como um Pai Amoroso (Jr.10:24;30:11;46:28; Sl.89:30-33;
ICr.21:13) A justiça remunerativa é aquela pela qual Deus recompensa, com Suas
bênçãos, aos homens pela obediência de Suas leis (Hb.6:10; IITm.4:8;
ICo.4:5;3:11-15; Rm.2:6-10; IIJo.8)
e) Ira: Esta deve ser considerada
como um aspecto negativo da santidade de Deus, pois em Sua ira Deus aborrece o
pecado e odeia tudo quanto contraria Sua santidade (Dt.32:39-41; Rm.11:22;
Sl.95:11; Dt.1:34-37; Sl.95:11). Podemos, então, dizer que a ira é a
manifestação da santidade negativa de Deus (Rm.1:18; IITs.1:5-10; Rm.5:9 etc).
A ira é também designada de severidade (Rm.11:22).
2) Bondade: É uma concepção
genérica incluindo diversas variedades que se distinguem de acordo com os seus
objetos. Bondade é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo (Mc.10:18;
Lc.18:18,19; Sl.33:5; Sl.119:68; Sl.107:8; Na.1:7).
A bondade implica na disposição
de transmitir felicidade.
a) Benevolência: É a bondade de
Deus para com Suas criaturas em geral. E' a perfeição de Deus que O leva a
tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas (Sl.145:9,15,16;
Sl.36:6;104:21; Mt.5:45;6:26; Lc.6:35; At.14:17).
Thiessen define benevolência como
a afeição que Deus sente e manifesta para com Suas criaturas sensíveis e
racionais. Ela resulta do fato de que a criatura é obra Sua; Ele não pode odiar
qualquer coisa que tenha feito (Jó.14:15) mas apenas àquilo que foi
acrescentado à Sua obra, que é o pecado (Ec.7:29).
b) Beneficência: Enquanto que a
benevolência é a bondade de Deus considerada em sua intenção ou disposição, a
beneficência é a bondade em ação, quando seus atributos são conferidos.
c) Complacência: É a aprovação às
boas ações ou disposições. É aquilo em Deus que aprova todas as Suas próprias
perfeições como também aquilo que se conforma com Ele (Sl.35:27; Sl.51:6;
Is.42:1; Mt.3:17; Hb.13:16).
d) Longanimidade ou Paciência: O
hebraico emprega a palavra erek'aph que significa grande de rosto e daí também
lento para a ira. O grego emprega makrothymia que significa ira longe. Portanto
longanimidade é o aspecto da bondade de Deus em virtude do qual Ele tolera os
pecadores, a despeito de sua prolongada desobediência. A longanimidade
revela-se no adiamento do merecido julgamento (Ex.34:6; Sl.86:15; Rm.2:4;
Rm.9:22; IPe.3:20; IIPe.3:15)
e) Misericórdia: Também expressa
pelos sinônimos compaixão, compassividade, piedade, benignidade, clemência e
generosidade. No hebraico usa-se as palavras chesed e racham e no grego eleos.
É a bondade de Deus demonstrada para com os que se acham na miséria ou na
desgraça, independentemente dos seus méritos (Dt.5:10; Sl.57:10; Sl.86:5;
ICr.16:34; IICr.7:6; Sl.116:5; Sl.136; Ed.3:11; Sl.145:9; Ez.18:23,32;
Ex.33:11; Lc.6:35; Sl.143:12; Jó 6:14).
A paciência difere da
misericórdia apenas na consideração formal do objeto, pois a misericórdia
considera a criatura como infeliz, a paciência considera a criatura como
criminosa; a misericórdia tem pena do ser humano em sua infelicidade, a
paciência tolera o pecado que gerou a infelicidade. A infelicidade e sofrimento
deriva-se de um justo desagrado divino, portanto exercer misericórdia é o ato
divino de livrar o pecador do sofrimento pelo qual ele justamente e
merecidamente deveria passar, como conseqüência do desagrado divino.
f) Graça: É a bondade de Deus
exercida em prol da pessoa indigna. Portanto graça é o ato divino de conceder
ao pecador toda a bondade de Deus a qual ele não merece receber (Ex.33:19).
Na misericórdia Deus suspende o
sofrimento merecido, na graça Deus concede bênçãos não merecidas. Todo pecador
merece ir para o inferno; assim Deus exerce Sua misericórdia livrando o pecador
da condenação. Nenhum pecador merece ir para o paraíso; assim Deus exerce a Sua
graça doando ao pecador o privilégio de ir gratuitamente para o paraíso.
Essa diferença entre misericórdia
e graça é notada em relação aos anjos que não caíram. Deus nunca exerceu
misericórdia para com eles, posto que jamais tiveram necessidade dela, pois não
pecaram, nem ficaram debaixo dos efeitos da maldição. Todavia eles são objetos
da livre e soberana graça de Deus pela qual foram eleitos (ITm.5:21) e
preservados eternamente de pecado e colocados em posição de honra (Dn.7:10;
IPe.3:22).
g) Amor: A perfeição da natureza
divina pela qual Ele é continuamente impelido a se comunicar. É, entretanto,
não apenas um impulso emocional, mas uma afeição racional e voluntária, sendo
fundamentada na verdade e santidade e no exercício da livre escolha. Este amor
encontra seus objetos primários nas diversas Pessoas da Trindade. Assim, o
universo e o homem são desnecessários para o exercício do amor de Deus. Amor é,
portanto, a perfeição de Deus pela qual Ele é movido eternamente à Sua própria
comunicação. Ele ama a Si mesmo, Suas virtudes, Sua obra e Seus dons.
3) Verdade: É a consonância
daquilo que é asseverado com o que pensa a Pessoa que fez a asseveração. Neste
sentido a verdade é um atributo exclusivamente divino, pois com freqüência os
homens erram nos testemunhos que prestam, simplesmente por estarem equivocados
a respeito dos fatos, ou então por pura incapacidade fracassam em promessas que
fizeram com honestas intenções. Mas a onisciência de Deus impede que Ele chegue
a cometer qualquer equívoco, e a Sua onipotência e imutabilidade asseguram o
cumprimento de Suas intenções (Dt.32:4; Sl.119:142; Jo.8:26; Rm.3:4; Tt.1:2; Nm.23:19;
Hb.6:18; Ap.3:7; Jo.17:3; IJo.5:20; Jr.10:10; Jo.3:33; ITs.1:9; Ap.6:10;
Sl.31:5; Jr.5:3; Is.25:1). Ao exercê-la para com a criatura, a verdade de Deus
é conhecida como sua veracidade e fidelidade.
a) Veracidade: Consiste nas
declarações que Deus faz a respeito das coisas, conforme elas são, e se
relaciona com o que Ele revelou sobre Si mesmo. A veracidade fundamenta-se na
onisciência de Deus.
b) Fidelidade: Consiste no exato
cumprimento de Suas promessas ou ameaças. A fidelidade fundamenta-se na Sua
onipotência e imutabilidade (Dt.7:9; Sl.36:5; ICo.1:9; Hb.10:23; Dt.4:24;
IITm.2:13; Sl.89:8; Lm.3:23; Sl.119:138; Sl.119:75; Sl.89:32,33; ITs.5:24;
IPe.4:19; Hb.10:23).
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